Deixou de lucrar nas redes sociais por conta de bloqueio injusto? Saiba como recorrer!

Casos mais comuns que ocorrem o bloqueio do usuário na rede social

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada em 2019 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 82,7% das casas brasileiras possuem acesso à internet. E como não bastasse a ampla utilização da internet no país, a pandemia veio para consolidar, ainda mais, o ambiente virtual como uma alternativa fundamental frente às exigências motivadas pela necessidade de afastamento social.

De acordo com o Comitê Gestor de Internet no Brasil, a utilização da internet foi intensificada durante a pandemia. Transações financeiras, atividades educacionais e até mesmo a atuação empresarial, migraram, parcial ou totalmente, para o mundo online.

E, concomitantemente, as redes sociais caminharam junto a esses novos desafios, não somente como ferramenta fundamental de comunicação interpessoal, mas, também como mecanismo essencial de sobrevivência social e econômica para indivíduos e empresas.

Por isso, para além da atuação (também relevante) de influenciadores digitais que faturam consideráveis quantias com as redes sociais, pessoas e empresas também utilizam esses ambientes como extensão de suas vidas pessoais, profissionais, sociais e econômicas. Sendo que essa situação ganhou ainda maior amplitude em tempos de e-commerce, home office e implantação de medidas sanitárias.

Estabelecido esse cenário, não é difícil imaginar a dimensão do impacto que o bloqueio de um usuário em uma rede social pode causar. Além dos aspectos financeiros, da perda de seguidores, a imagem do indivíduo também pode ficar maculada, não somente perante os seus contratantes, mas também em relação a pessoas queridas, causando prejuízos materiais e morais.  

E mesmo diante da possibilidade dessas consequências danosas, o que se tem constatado na prática com frequência, é a retirada unilateral e sem aviso prévio do usuário sob a mera justificativa de violação dos termos de uso, sem o fornecimento de informação ampla e adequada sobre os motivos do bloqueio.

Mas, será que a rede social pode agir dessa forma? Ao analisar o direito brasileiro, verifica-se que esse tipo de iniciativa (bloqueio unilateral das redes sociais) conta com limitações.

Quais as medidas que podem ser tomadas, caso haja suspensão ou bloqueio injusto da rede social?

Constituição Federal prevê a liberdade de manifestação de pensamento como um direito fundamental no seu artigo 5º, inciso V quando determina que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, bem como no seu inciso IX quando estabelece que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.

No mesmo sentido, podem ser destacados os artigos 2º e 3º da Lei n° 12.965/14, denominada como Marco civil da Internet que assegura a liberdade de expressão, bem como o artigo 8º da mesma lei que estabelece o livre acesso à internet como uma garantia.

No entanto, se é certo que nenhum direito é absoluto, não sendo permitido que o indivíduo abuse das suas garantias e liberdades para ofender outras pessoas ou propagar “fake news”, algo realmente comum nos meios virtuais, também pode se afirmar que não pode a rede social de determinado usuário ser simplesmente excluída sob o argumento geral de violação dos termos de uso.

A simples exclusão, sem uma justificativa palpável que possibilite o direito de resposta, acaba por violar o direito à ampla defesa e ao contraditório, que também podem ser destacados como direitos fundamentais previstos constitucionalmente.

Aliás, o artigo 19 da Lei que dispõe sobre o Marco Civil da Internet estabelece que a indisponibilidade de conteúdo de um terceiro pressupõe a necessidade de prévia ordem judicial.

A situação se apresenta ainda mais grave, uma vez que essa exclusão é operacionalizada utilizando-se de algoritmos, que estão sujeitos a equívocos em relação à violação dos termos de uso. Logo, ocorre uma exclusão unilateral, sem que ao menos a parte interessada seja devidamente informada para impedir um bloqueio injusto e errôneo.

Por isso, essa exclusão pode configurar ato ilícito (violação do direito) nos termos do artigo 186 do Código Civil Brasileiro, causando prejuízos econômicos e morais, o que gera responsabilização e o dever de indenizar.

Ocorre que para aqueles que lucram, ou até mesmo sobrevivem da internet, os prejuízos são majorados a cada dia de ausência de acesso à rede social. A perda de seguidores, questões contratuais, impactos em relação à imagem perante consumidores, contratantes e até mesmo no que se refere ao círculo social respectivo geram consequências que exigem medidas urgentes para solucionar a situação.

A boa notícia é que o direito conta com ferramentas processuais que permitem que o caso seja analisado com maior rapidez e que a conta do usuário seja restabelecida. Por isso, o caminho diante dessa situação é procurar o acompanhamento de uma advocacia especializada, que poderá recorrer ao judiciário com uma medida liminar, requerendo a imediata restauração da conta excluída, bem como a cominação de uma multa diária para que a parte contrária seja pressionada a cumprir a obrigação de fazer.

Mas, será que basta a restauração da conta do usuário para que a questão seja solucionada? E os prejuízos causados? Como indenizar?

Antes de responder esse questionamento, é necessário diferenciar os tipos de danos que podem ocorrer: os danos morais e os danos materiais. O dano moral pode ser conceituado de forma simplificada como o sofrimento causado ao indivíduo, é quando é afetado o patrimônio imaterial, os sentimentos, a honra. É algo que não pode ser facilmente comprovado e dimensionado, por isso, existe muita discussão na doutrina e na jurisprudência em relação a sua aferição.

Ressalta-se que mesmo a pessoa jurídica, de acordo com posicionamento pacífico da doutrina e da jurisprudência, também pode sofrer dano moral quando é afetada  a sua honra objetiva, ou seja, quando a sua reputação perante terceiros é atingida.

Já o dano material diz respeito ao patrimônio material, aquilo que implicou em prejuízo financeiro. E isso engloba não somente o que foi efetivamente perdido, mas também o que se deixou de ganhar.

O prejuízo direto ou imediato é denominado pelo direito como danos emergentes. Um exemplo que facilita a visualização desse conceito é o caso de um motorista de aplicativo que tem o seu carro atingido. Os custos com o conserto do carro é facilmente verificável e caracteriza os danos emergentes.

Mas, a necessidade do carro ficar na oficina ou até mesmo situações de danos físicos que impossibilitam o trabalho, por exemplo, pode impedir o motorista de trabalhar. Logo, consequentemente, sem rodar, o motorista não obtém o seu lucro diário, ou seja, deixa de ganhar. Esse prejuízo é denominado pela doutrina como lucros cessantes.

Essa diferenciação é extremamente importante quando se trata de danos decorrentes de bloqueio injusto de redes sociais. Afinal, quem se utiliza do ambiente virtual arca com prejuízos quando deixa de postar, de ganhar seguidores, curtidas e compartilhamentos, de criar engajamentos, de cumprir contratos, entre outras situações.

Mas, um questionamento que pode surgir é no sentido de que, ao contrário do dano emergente que pode ser comprovado de forma direta, como comprovar e mensurar os lucros cessantes nessas situações?  

Como apresentar lucros cessantes caso minha rede social seja bloqueada indevidamente?

Documentos necessários

A verificação dos lucros cessantes é uma tarefa desafiante, pois não existem meios de prever com exatidão quanto se deixou de ganhar durante o período de bloqueio da rede social.

É uma análise feita com base na estimativa, por isso, é importante que exista uma documentação relacionada ao faturamento, aos contratos que já foram firmados, aos números de seguidores, pois todos esses elementos servirão como prova de prejuízo e fundamento para  o cálculo relativo aos lucros cessantes.

Como calcular

O cálculo dos lucros cessantes terá como base a média do faturamento obtido, extraídas as despesas mensais. É um valor que precisa ser provado e delimitado a determinado período.

Qual a jurisprudência do bloqueio pelas redes sociais?

A jurisprudência tem se firmado no sentido de determinar liminarmente a restauração do conteúdo da rede social, sob pena de cominação de multa diária. Situação que pode ser revertida, caso seja comprovado que o usuário realmente tenha violado os termos de serviços determinados pelo provedor.

Além disso, a exclusão injusta, sem aviso prévio e oportunidade de defesa, pode gerar impactos financeiros e nos direitos de personalidade, caracterizando tanto os danos morais quanto materiais (danos emergentes e lucros cessantes).

Destaca-se que a constitucionalidade do artigo 19 da Lei que estabelece o Marco Civil da internet e determina a necessidade de ordem judicial prévia impondo a exclusão de conteúdo por parte do provedor da internet, para que exista a possibilidade de sua responsabilização, está sendo debatida pelo STF no RE 1037396.

O STF já havia marcado em 2020 uma audiência pública para permitir amplo debate social sobre o tema, mas devido à situação pandêmica que assolou o mundo e o país, o evento foi suspenso. Mas, a retomada dessa decisão já está prevista para o mês de junho de 2022.  

Indenização por bloqueio indevido nas redes sociais

A exclusão unilateral de conta das redes sociais, sem a devida oportunidade de defesa, além de violar os direitos fundamentais da liberdade de expressão, da livre manifestação de pensamento, do contraditório e da ampla defesa também ofende o princípio da boa-fé objetiva estabelecido no artigo 422 do Código Civil Brasileiro.  

O referido artigo é citado por parte da doutrina, como consequência do fenômeno da constitucionalização do Direito Civil e da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que nada mais é do que o reconhecimento da obrigatoriedade dos particulares também respeitarem os direitos fundamentais nas relações privadas.

Logo, o provedor possui o dever de informar e de possibilitar mecanismos para o direito de resposta, sob pena de configuração de ato ilícito nos termos do artigo 186 do Código Civil, gerando o dever de indenizar tanto pelos danos morais e materiais, sendo que os últimos englobam danos emergentes e lucros cessantes.  

Instagram hackeado, como proceder?

A invasão em perfil de instagram pode gerar o dever de indenizar, uma vez que configura falha na prestação de serviços de segurança e violação do Código de Defesa do Consumidor.

É o que decidiu um magistrado do 2º Juizado Especial Cível de Brasília, no processo de n° 0741146-28.2021.8.07.0016, que determinou a responsabilização do provedor, independente de culpa, pela falha na prestação de serviços, especialmente em relação à segurança.

Além disso, segundo a decisão, restou configurado o sofrimento da vítima, o que gera o dever de indenizar frente ao dano moral ocorrido.

Também pode ser citada uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro a título de exemplo, que reconheceu a  negligência do provedor na prestação dos serviços de segurança, bem como a configuração do dano e a necessidade de indenização:  

APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZATÓRIA. REDE SOCIAL “FACEBOOK”. PERFIL FALSO COM UTILIZAÇÃO DE IMAGENS DA AUTORA E CONTEÚDO OFENSIVO DE TEOR SEXUAL. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA NA RETIRADA DO PERFIL MALGRADO PEDIDO APRESENTADO PELA AUTORA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. INAPLICABILIDADE DO CHAMADO “MARCO CIVIL DA INTERNET” POR VIGÊNCIA POSTERIOR AOS FATOS EM QUESTÃO. DANO MORAL. VALORAÇÃO CORRETA DO QUANTUM. 1. Ante a induvidosa criação de perfil falsamente atribuído à autora, com veiculação de conteúdo ofensivo, de teor sexual, a ensejar mácula à sua imagem e à de suas irmãs, adequando-se autora e réu à definição dos elementos subjetivos da relação de consumo, conforme arts. 2º e 3º do CDC, configura-se a responsabilidade de natureza objetiva. 2. A tese defensiva de fato de terceiro mostra-se descabida na medida em que, ao sequer identificar esse terceiro a quem busca imputar responsabilidade exclusiva pelas páginas ofensivas, a empresa revela, no mínimo, que a criação de perfis prescinde de qualquer controle efetivo e seguro de sua parte. Essa forma de atuação, que negligencia o controle na criação de perfis sem identificação segura, deixa evidente que pouco importa à empresa tal fato, sendo aceito como normal, a ponto de poder ser considerado como fortuito interno – risco inerente ao negócio da empresa, não pela natureza mesma de sua atividade, mas em razão do modus operandi por ela adotado -, que, como tal, não exclui o nexo de causalidade. 3. Negligência da ré ao pronto atendimento de comando para retirada das páginas ofensivas, o que só veio a acontecer por força de determinação judicial, portanto já no curso da presente demanda. 4. Não há que se cogitar acerca da aplicação do art. 19 da Lei 12.965/2014 (“Marco Civil da Internet”), que somente veio a viger posteriormente aos fatos em questão, sob pena de quebra do princípio tempus regit actum. 5. Inegável falha na prestação do serviço que faz surgir para a empresa o dever da reparação do dano moral advindo da mácula à imagem da autora, mostrando-se prudente e moderado o arbitramento do quantum laborado pelo sentenciante, no patamar de R$5.000,00. 6. Recurso desprovido. 0098172-38.2012.8.19.0038 – APELAÇÃO VIGÉSIMA SÉTIMA C MARA CÍVEL CONSUMIDOR Des(a). MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES – Julg: 15/02/2017 Ementário de Jurisprudência Cível Nº 30/2017

Por isso, a medida mais adequada é consultar a advocacia especializada, que poderá solicitar uma medida de urgência, bem como a indenização devida de acordo com as características presentes no caso concreto.

Cabe danos morais, nos casos de bloqueio indevido?

O bloqueio das redes sociais pode afetar os direitos de personalidade, o que pode provocar sofrimento e danos tanto à honra subjetiva quanto à honra objetiva no caso de empresas.

A jurisprudência vem decidindo que o bloqueio indevido das redes sociais é um evento que ultrapassa o mero aborrecimento, pois gera sofrimento na vítima que pode ter a sua imagem maculada perante terceiros.

Destaca-se que a quantificação do dano moral é extremamente desafiante, pois como mensurar monetariamente o valor da dor do indivíduo? Para isso, cabe ao juiz,perante os elementos trazidos pelo caso concreto avaliar, entre outros aspectos, as cláusulas contratuais, o poder econômico de ambas as partes, para que a indenização iniba a conduta ilícita, mas que, ao mesmo tempo, o ressarcimento não sirva como um instrumento de enriquecimento. . 

Gostou deste artigo? Compartilhe

Veja também