Alienação Fiduciária: como funciona, seus riscos e vantagens.

O que é Alienação Fiduciária? 

A Alienação Fiduciária é uma modalidade de garantia real na compra de determinado imóvel, regulamentada pela Lei n° 9.514/97, sendo definida como uma espécie de negócio mediante o qual o devedor (fiduciante), transmite a propriedade imobiliária ao credor (fiduciário), em garantia da dívida assumida pela aquisição do imóvel.

O objetivo principal da alienação fiduciária é gerar maior facilidade ao consumidor na aquisição de bens e garantia mais eficaz ao financiador, protegendo a propriedade resolúvel da coisa financiada enquanto o fiduciante não quitar a dívida,  concedendo ao legislador instrumentos processuais eficientes. Pode compreender a alienação fiduciária como um contrato acessório de garantia.

Desta forma, a alienação fiduciária normalmente é atrelada a um contrato principal, de empréstimo ou financiamento, celebrado pelo devedor para aquisição de bem, no qual o proprietário, transfere ao credor (agente financeiro), em caráter resolúvel, a propriedade do imóvel, registrando tal ato jurídico, até que haja o cumprimento das obrigações do contrato principal. 

Somente com o pagamento da dívida e a quitação dada ao devedor, segue-se, assim, com o cancelamento da garantia, revertendo-se a propriedade do bem ao antigo devedor, por isso o seu caráter acessório. 

Como a Alienação Fiduciária funciona na prática?

Em termos práticos, imaginemos a seguinte situação: 

João adquire um imóvel de determinada construtora e ingressa na relação jurídica para financiar a aquisição. João recebe a propriedade da construtora e transfere, no mesmo ato, ao banco, que por sua vez, entrega o dinheiro à construtora. Com o cumprimento integral da obrigação contratual com o banco, consolida-se, nos termos da lei, a propriedade nas mãos de João, resolvendo-se a propriedade do banco credor, ora fiduciário. 

A lei determina que, ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias do cumprimento integral da obrigação pactuada, deverá o banco fiduciário fornecer a carta de quitação, o qual o fiduciante levará à averbação junto ao oficial de Registro de Imóveis, tornando-se definitiva a propriedade em seu nome. 

Cumpre ressaltar, que o não fornecimento do termo de quitação ao fiduciante importa em possibilidade de pleitear judicialmente a aplicação e condenação do banco fiduciário ao pagamento de uma multa no importe de até 0,5% ao mês ou fração do valor do contrato. Contudo, ressalta-se que não é necessário a efetiva entrega do termo, mas, apenas, colocá-lo à disposição do devedor (fiduciante). 

Essa fração ou percentual arbitrado deverá ser proporcional aos dias em atraso. Poderá, contudo, haver a estipulação de percentual ou fração maior a ser pago pelo banco, caso o juiz entenda que ao caso deverá ser aplicado índice maior, adequado e atentando-se à função inibitório da multa legal. 

Assim, deve-se haver a formulação de pedido em caráter de tutela provisória de urgência, aplicando-se a multa de forma a observar o caráter inibitório da multa legal, determinando que haja o imediato cumprimento e fornecimento do termo de quitação por parte do banco fiduciário.

É preciso observar, entretanto, que não é a quitação fornecida pelo credor que opera a consolidação da propriedade nas mãos do devedor, mas o pagamento da dívida.

Sendo assim, a sentença declarará a dívida e determinará ao oficial de Registro de Imóveis o cancelamento da propriedade registrada em nome do credor, além de condená-lo no pagamento da multa pelo indevido retardamento na obrigação legal de outorgar a quitação, que reverterá em benefício do fiduciante (devedor).

Etapas do processo da Alienação Fiduciária.

Para entender o processo da alienação fiduciária é importante entender quem são as partes desse processo. Assim, são partes na alienação fiduciária: 

(i) O vendedor;

(ii) O fiduciante (devedor);

(iii) O fiduciário (credor). 

Em qualquer caso, é realizada a venda ao fiduciante com elaboração de alienação fiduciária em favor do fiduciário. Assim, o devedor (fiduciante) recebe a propriedade e transmite, em garantia, ao credor (fiduciário).

Entende-se como processo/etapas da alienação, respectivamente:

(i) Elaboração do contrato de alienação fiduciária, no qual deverá estipular o bem adquirido ou o crédito fornecido e a modalidade de garantia ficará registrada; 

(ii) Em sequência, o registrado do contrato em cartório ou ao local onde o bem estiver matriculado, em caso de bens móveis e por fim;

(iii) No cartório, será realizado o desdobramento de posse, na qual o bem deixará de ter apenas um proprietário. O devedor é o possuidor direto, que tem a posse do imóvel, enquanto o credor será o possuidor indireto.

Frisa-se que, a alienação fiduciária poderá ser utilizada tanto por instituições financeiras autorizadas a operar no Sistema Financeiro Imobiliário quanto pelas demais pessoas físicas ou jurídicas.

Vantagens da Alienação Fiduciária.

Podemos destacar entre as principais vantagens da alienação fiduciária, que as instituições financeiras reduzem os juros e aumentam o período de parcelamento dos serviços de crédito. 

Interessante, outrossim, a sua posição acerca da propriedade resolúvel, considerando que o devedor é proprietário desde a aquisição original, anterior à transmissão fiduciária resolúvel, na exata medida em que a propriedade é transferida fiduciariamente ao credor, a propriedade gera todos os efeitos estabelecidos pela lei até que o devedor pague o preço devido.

Riscos da Alienação Fiduciária. 

Em contrapartida, entende-se por maior risco da alienação fiduciária o fato de o bem alienado passar a ser propriedade do credor. Caso a pessoa que colocou o bem como garantia não consiga pagar as parcelas, pode gerar consequências, acabar perdendo seu bem.

Nesse caso, o credor tem o direito de vender o bem alienado para que cubra o saldo devedor restante com o valor da venda. Entretanto, lembre-se que não é esse o objetivo das instituições financeiras. Elas ganham quando você consegue quitar o empréstimo.

A relação entre a Alienação Fiduciária e outras garantias. 

São direitos reais de garantia, respectivamente: a hipoteca, o penhor e a anticrese. 

Ante a necessidade crescente de dinamizar e facilitar o crédito, bem como a circulação de riquezas. Por essa razão tantas são as leis que procuraram eficientizar a hipoteca e o penhor, especialmente este último, atribuindo-lhes características ausentes nos respectivos institutos originais do Código Civil.

Nesse sentido, a alienação fiduciária em garantia foi introduzida pela legislação para dar substrato aos contratos de financiamento, especificamente de bens móveis e duráveis, que se compõe ao rol já existente, com características próprias.

De fato, a Lei n° 4.728/65, estruturadora do mercado de capitais, criou o instituto, que ganhou contornos materiais e processuais definitivos com o decreto-lei n° 911/69, que alterou a redação do art. 66 da referida lei. A garantia fiduciária se demonstrou muito útil no mundo negocial, em seus nove artigos. O instituto sofreu nova configuração por força da Lei n° 10.931/04, a qual teve por finalidade maior criar o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias.

Diferença entre Garantias Pessoais e Garantias Reais.

A alienação fiduciária não deve ser confundida com a hipoteca. A hipoteca é direito real de garantia que recai sobre coisa alheia. No caso, o credor (fiduciário) possui um direito de garantia que recai sobre coisa própria.

Com isso, tem-se a particularidade fiduciária do negócio. O bem é transferido para fins de garantia. Sob esse aspecto, não se confunde com os direitos reais de garantia do Código Civil, como o penhor, a hipoteca e a anticrese, porque nestes existe direito real limitado, ao contrário da alienação fiduciária que opera-se a transferência do bem. Quem aliena não grava. O devedor fiduciante aliena o bem ao credor fiduciário. No penhor e na hipoteca, o credor tem direito real sobre a coisa alheia, ao contrário da garantia fiduciária que possui direito real sobre a própria coisa.

Tem-se, portanto, as seguintes espécies de direito real de garantia: 

(i) Alienação fiduciária, como já definimos, nessa forma de garantia, o bem deve ser colocado no nome do credor até que a dívida seja quitada. Mesmo que o devedor utilize o bem e tenha sua posse, juridicamente o bem não é sua propriedade;

(ii) Hipoteca, em que um bem imóvel e alguns móveis deve ser entregue como garantia do pagamento da dívida ao credor. A diferença é que qualquer bem pode ser entregue como pagamento da dívida e não necessariamente o bem que o devedor tem a posse;

(iii) O penhor, em que o devedor precisa entregar um bem móvel para o credor até o pagamento da dívida. Esses bens móveis podem ser veículos, jóias, coleções, etc. A principal diferença é que a propriedade é do devedor e o bem fica em posse do credor até que a dívida seja quitada.

Nesse sentido, a Lei n° 9.514/97, que trata da alienação fiduciária, inova o tradicional sistema legal de garantias do direito pátrio. O devedor (fiduciante) possui um direito não deferido, que é classificado como condicional.

Podemos dizer que é um ato jurídico sob condição resolutiva, nos termos dos arts. 127 e 1.359, do Código Civil, ou seja, o credor é proprietário até que o evento futuro e incerto ocorra o pagamento da totalidade das parcelas que extingue a propriedade do credor.

Posso vender um bem alienado?

Há o questionamento acerca da possibilidade de venda de um bem alienado. Mas sim, é possível e há o entendimento do Superior Tribunal de Justiça em igual sentido. 

Desta forma, importa compreender que a alienação do bem, em regra, estará vinculada a contratos de empréstimo ou financiamentos, em que o bem em questão é a garantia para o pagamento da dívida.

Isto significa, que enquanto o empréstimo ou financiamento não estiver quitado, a Instituição Financeira, que é credora da dívida, detém também a propriedade do imóvel.

Como vender um imóvel ou veículo alienado?

Para o Direito, há distinção entre propriedade e posse, e, estar de fato dentro do imóvel, não significa que de fato seja dono. Com isso, seguindo essa lógica, entende-se que, enquanto alienado o imóvel, o devedor do financiamento ou empréstimo, não é dono dele, e portanto, não poderá dispor do mesmo, sem anuência da Instituição Financeira que é credora do financiamento ou empréstimo.

Nesse caso, ainda que seja possível a venda de um imóvel alienado, deve-se entender que não se trata de uma negociação segura, orienta-se que não seja realizada sem devida averbação na matrícula do imóvel. 

Deve-se, portanto, realizar imediato à assinatura do contrato particular de compra e venda, o registro, e a averbação do contrato na matrícula do imóvel. 

É possível entender a compra de um imóvel ou veículo alienado como também uma forma da empresa/banco fiduciante reaver os valores inerentes à inadimplência contratual. 

Assim, as construtoras, incorporadoras e os bancos que financiam imóveis utilizam a alienação fiduciária como uma forma de segurança. Durante o financiamento, a propriedade permanece no nome da empresa, somente após o pagamento da última parcela, é que transfere-se para o nome do novo dono. Importante destacar que nesse meio tempo, o comprador usufrui normalmente do imóvel.

Entretanto, caso não haja o pagamento e o cumprimento da obrigação, é possível que, em busca da satisfação do débito inadimplente, o fiduciário coloque o imóvel à venda ou inclusive, em empresas terceirizadas responsáveis por leiloar apartamentos com débito junto a empresas fiduciárias.

Aquele que comprar o bem leiloado terá que arcar com um valor estipulado pela instituição dentro de um prazo de 30 a 60 dias.

O que acontece em casos de inadimplência? 

Em caso de inadimplência no contrato de alienação fiduciária, a lei especial abre ao credor, que no caso será instituição financeira ou assemelhada, quatro possibilidades para haver o preço do débito em aberto, se esta lhe for entregue efetivamente pelo devedor:

I. Apreensão do bem;

II. Na hipótese de o bem não ter sido encontrado, poderá propor ação de busca e apreensão;

III. A execução também persiste para a cobrança de saldo em aberto quando o preço de venda não for suficiente para extinguir a dívida;

IV. Leilão do bem.

Em tese, o credor fiduciário (instituições financeiras do sistema nacional) pode optar por uma dessas medidas. No entanto, é a ação de busca e apreensão regulada pelo decreto-lei que fornece o meio mais eficaz de realização do valor da dívida.

A jurisprudência resiste em admitir esses remédios processuais, mormente a ação de busca e apreensão, quando o credor não for entidade financeira do sistema brasileiro.

Supondo que o credor fiduciário tenha a posse do bem e satisfaça a dívida, extingue a obrigação e resolve-se a propriedade de plano para o credor, que dará a quitação ou declaração equivalente. 

Se a dívida não for paga, no todo ou em parte, o devedor fiduciante deverá ser constituído em mora para possibilitar que a propriedade seja consolidada em nome do fiduciário.

A lei procurou de alguma forma simplificar o procedimento de consolidação da propriedade, excluindo tanto quanto possível a intervenção do Poder Judiciário. O fiduciante, seu representante legal ou procurador seja intimado pelo oficial do Registro de Imóveis, para satisfazer ao débito em aberto, prestações vencidas e vincendas até a data do pagamento, no prazo de 15 dias. 

Nesse débito devem ser incluídos os juros, penalidades legais e demais acréscimos. O contrato especificará o prazo de carência após o qual será expedida a intimação.

Normalmente, nos planos de financiamento imobiliário, aguarda-se um prazo razoável de até três meses para liquidação do débito, possibilitando uma resolução mais branda da pendência. Nada impede, porém, que o contrato possibilite a intimação pelo oficial, tão logo encontrar-se em mora o devedor.

A intimação deverá ser feita pessoalmente, podendo ser efetuada também pelo correio, com aviso de recebimento, ou mediante solicitação do oficial do registro imobiliário, por Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la. Como nem sempre o registro imobiliário está estruturado para efetuar intimações, principalmente nas grandes cidades, o ato pode ser delegado aos correios ou ao oficial de títulos.

A mora poderá ser purgada junto ao Cartório do Registro Imobiliário, devendo o oficial entregar a importância ao credor nos três dias subsequentes, deduzindo as despesas de cobrança e intimação.

Assim, consolidada a propriedade em nome do fiduciário, este, no prazo de 30 dias, contados da data do registro, promoverá leilão público para alienação do imóvel, ao contrário do que ocorre para os móveis, quando se permite a venda livre. O ato deve ser precedido da devida divulgação.

Para tanto, é importante destacar que para os bens móveis, não é permitido que o credor fique com o bem, tudo isso para evitar abusos. Para os imóveis, o leilão é obrigatório, enquanto para os bens móveis, a ação de busca e apreensão se torna medida padrão. 

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